Por Sérgio Roberto Santos
Segundo dados do Instituto de Pesquisas Espaciais (INPE) [1], as descargas atmosféricas são responsáveis por 70% dos desligamentos na transmissão e 40% na distribuição de energia elétrica, além de causarem 40% das queimas em transformadores no Brasil. Esses números indicam que as descargas atmosféricas prejudicam a qualidade da energia elétrica consumida no país, o que pode ser comprovado pela correlação entre a densidade das descargas atmosféricas para a terra (Ng) em um local e os índices de Duração Equivalente de Interrupção por Unidade Consumidora (DEC) e Frequência Equivalente de Interrupção por Unidade Consumidora (FEC) das empresas brasileiras de energia elétrica.
Na área de energias renováveis, as descargas atmosféricas são uma das principais causas de falhas em Sistemas Fotovoltaicos (SFV), segundo dados de seguradoras alemães, que indicam que elas causam 26% dos danos em SFV na Alemanha [2], país com Ng muito inferior ao do Brasil. Também nesse caso, é necessário avaliar não só a queima de equipamentos, mas também a interrupção do fornecimento de energia enquanto a instalação não é reparada.
Em um caso concreto, acontecido no interior do estado de São Paulo, a interrupção da energia elétrica pela concessionária local resultou na queima do comando de três elevadores, no que é conhecido como surto por chaveamento, com o custo de R$7000,00, apenas em peças, por elevador. Caso os elevadores estivessem protegidos por Dispositivos de Proteção contra Surtos (DPS) classe 3 para energia, custo aproximado de R$200,00 por elevador, queimas como essa não aconteceriam.
Em uma economia dinâmica, valendo a máxima tempo é dinheiro, a interrupção da comunicação entre empresas e clientes, ou entre setores da mesma empresa, pode causar inúmeros prejuízos, imediatos ou a médio e longo prazo, causados pela perda de pedidos ou clientes. Mesmo que os sistemas voltem após um período, muito do que se perdeu não será recuperado. Por isso, o objetivo da proteção contra surtos vai além da proteção dos equipamentos, envolvendo a confiabilidade dos processos, permitindo que instalações elétricas, de energia e sinal, continuem funcionando durante e após a ocorrência de descargas atmosféricas. Caso aconteça a interrupção de serviços como emissão de notas fiscais ou recebimento de pedidos os prejuízos podem ser maiores do que os custos com a troca de máquinas ou equipamentos.
Pelo que foi exposto, atualmente a Proteção contra Descargas Atmosféricas (PDA) é dividida em duas partes independentes, mas complementares:
1) Sistema de Proteção contra Descargas Atmosféricas (SPDA), normalizado na parte 3 da norma técnica ABNT NBR 5419:2015 Versão corrigida 2018, Proteção contra descargas atmosféricas [3].
2) Medidas de Proteção contra Surtos (MPS), normalizado na parte 4 da norma técnica ABNT NBR 5419:2015 Versão corrigida 2018, Proteção contra descargas atmosféricas [4].
Enquanto o SPDA protege uma edificação ou estrutura contra o impacto direto de uma descarga atmosférica, as MPS, incluindo a instalação de DPS, protegem as instalações elétricas, de energia ou sinal, dessa edificação/estrutura contra os surtos de tensão ou corrente causados pelas descargas atmosféricas diretas ou indiretas. O que será necessário, SPDA, MPS, ou ambos, é definido na parte 2 da norma técnica ABNT NBR 5419:2015, que trata do Gerenciamento de Risco (GR) [5]. Entre os 4 riscos existentes, o quarto risco (R4) associa às descargas atmosféricas a perda de valor econômico de um edificação ou estrutura. Segundo essa norma, os prejuízos econômicos causados por uma descarga atmosférica devem ser minimizados através da utilização das MPS, principalmente pela instalação de DPS.
Desta forma, a PDA vai muito além da instalação de um “para-raios” no topo de um prédio. Ela envolve a redução da vulnerabilidade dos sistemas eletroeletrônicos às descargas atmosféricas diretas e indiretas (muito frequentes), evitando que um processo seja interrompido. Como uma edificação/estrutura pode ser construída e utilizada com ou sem a PDA, seus responsáveis devem estar conscientes que a não instalação de um DPS não significa uma economia, mas a transferência do custo de capital (CAPEX) para o custo operacional (OPEX), sendo o valor do segundo maior do que o primeiro, correspondendo a uma taxa de juros que será cobrada por uma decisão equivocada.
As MPS devem ser vistas como um investimento da confiabilidade de processos, tornando as atividades de uma empresa muito menos vulneráveis aos efeitos das descargas atmosféricas.
Referências:
1] Grupo de Eletricidade Atmosférica (ELAT) do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). http://www.inpe.br/webelat/homepage/menu/infor/relampagos.e.efeitos/sistema.eletrico.php
2] Nasir, M.S.M. Et al. Lightning performance analysis of a rooftop grid-connected solar photovoltaic without external lightning protection system. PLOS ONE, 11 de julho de 2019.
3] Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). ABNT NBR 5419-3:2015 Versão Corrigida:2018 Proteção contra descargas atmosféricas Parte 3: Danos físicos a estruturas e perigos à vida.
4] Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). ABNT NBR 5419-4:2015 Versão Corrigida:2018 Proteção contra descargas atmosféricas Parte 4: Sistemas elétricos e eletrônicos internos na estrutura.
5] Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). ABNT NBR 5419-2:2015 Versão Corrigida:2018 Proteção contra descargas atmosféricas Parte 2: Gerenciamento de risco.
Esse é um assunto que deve ser levado mais a sério no Brasil. Principalmente no Brasil que tem muitas ocorrências, mas as pessoas só acreditam depois que acontece um prejuízo, boa matéria pessoal, obrigado.